Antes de mais, obrigado, querido leitor ou querida leitora, por ter cliclado no botão subscrever! É mais uma prova de confiança; mas não se iluda: temos muito trabalho a fazer e ainda só estamos no primeiro patamar de dificuldade. Sim, isto não vai ser fácil. E se estava à espera de passividade, essa terá de ser encontrada noutro lado, porque da escrita partimos para a acção. Estou novamente a repetir-me, não é? Tem de ser.
Caso seja novo leitor ou nova leitora, ou apenas para avivar a memória, compus um brevíssimo Manual de Instruções da newsletter 12 Pessoas em Fúria (cujo título apresento em maiúsculas em homenagem à forma como a extrema-direita gosta de debater):
Ler
Compreender
Agir
Seria ingénuo eu achar que alguma transformação viria de uma newsletter – vem dos leitores. Eu sei que escrevo para pessoas interessadas em sinalizar ou perceber o quão intolerante é a agenda do Chega, mas isso é pregar aos convertidos. O que se espera de si, querido leitor ou querida leitora, é que retenha o que lhe aprouver destes escritos e os comunique como protesto; isto é, contra os atentados às liberdades, direitos e garantias que vão sendo tentadas por qualquer um dos deputados da extrema-direita.
O meu objectivo não é, com esta newsletter que agora começa e que se prevê que dure 48 meses, apontar tudo o que de mal fizeram estes inaptos representantes de parte da população; é, antes, dar ferramentas a leitores e leitoras para que consigam desconstruir o argumentário de quem os defende; para que depois seja mais fácil deslegitimar o sentido de voto. E começamos já com o primeiro ponto: independentemente da razão, votar no Chega é motivo de vergonha – não há volta a dar (e eles bem querem ficar-nos com a palavra).
Muito poucas pessoas querem, realmente, a agenda do Chega. Do eleitorado, arriscaria dizer ninguém, mesmo. Porém, como muitas pessoas estão fartas “do sistema”, é fácil agarrarem-se a qualquer coisa. Antes de prosseguir, importa abrir um parêntesis para explicar que a recusa da agenda do Chega não significa que a extrema-direita esteja sempre errada – se assim fosse não precisaríamos de alertar os outros.
A questão divide-se em subversão e invenção: primeiro, de usar problemas complexos e dar-lhes soluções fáceis – o populismo; depois, a inventar realidades e problemáticas, roubadas de outras latitudes, para justificar políticas intolerantes.
Conceptualmente, este é o mais ou menos o método da extrema-direita. O mais curioso é que nem tem mudado assim tanto ao longo dos anos. Claro que as redes sociais são um factor a ter em conta, mas se antes dizíamos que era importante considerar as fontes de jornais, hoje dizemo-lo sobre as partilhas no Facebook. A maior complexidade, maior dedicação. É preciso muita paciência porque desconstruir o apelo ao pathos é muito difícil. Das melhores estratégias que vi e testemunhei foi a colocação no lugar da pessoa. Passo a explicar:
Se o pai de uma menina diz que vai votar no Chega, fazê-lo ver que essa agenda é um retrocesso para os direitos das mulheres e que, basicamente, está a votar para que a filha tenha uma vida pior é uma boa estratégia.
Agora que entrámos já em casos práticos, vamos ver as tropelias que os meninos e a menina andaram a preparar ao longo deste primeiro mês de legislatura. Naturalmente, o escrutínio não ficará pelas sessões parlamentares, uma vez que os deputados visitarão, para infelicidade dos presentes, outros fóruns. Por fim, também as redes sociais entrarão no pacote, que eu desconfio que é o Ventura que carrega no botão (ele não consegue resistir, é ver o Twitter).
A coisa começou logo mal (bem para os democratas), quando os nomes do Chega foram rejeitados para a vice-presidência da Assembleia da República. A discussão já saiu da praça mediática e só quero reforçar uma ideia: tratava-se de uma votação. E as regras do voto é que cada um escolhe o que quer e logo se vê quem ganha. Se nenhum deputado do Chega agradou aos restantes 218 deputados, azar.
No início do mês tivemos o escandaloso aproveitamento por parte do cabecilha da extrema-direita nos casos em que polícias morreram. Augusto Santos Silva não terá uma vida fácil: vigilante pelo pleno respeito da Constituição e das regras do debate democrático, terá de estar altamente atento, não permitindo a vitimização dos elementos do Chega.
São sabidas as paupérrimas condições que em que muitos polícias e agentes vivem. Desde camaratas sem condições mínimas a subsídios pífios, há muito para melhorar na PSP e na GNR. Por isso, Ventura, a Lapa, agarra-se com tudo o que pode a estes temas. Mas convém não esquecer o racismo e xenofobia que proliferam nas forças de segurança, e o uso da força excessiva sempre nos mesmos bairros. Cabe aos partidos democráticos melhorar tanto as condições de vida destes profissionais como de quem estes têm de defender: todos os cidadãos e todas as cidadãs, por igual.
Parece-me que a AR está a agir de acordo com os princípios liberais de inadmissibilidade da intolerância dos intolerantes, como se pode observar na notícia Bloco central vai estender-se ao Conselho de Estado para manter “cerca” ao Chega.
Já sobre a notícia de que o Chega quer lugar na comissão contra a discriminação racial (que propôs extinguir) para “discutir” o racismo, eu genuinamente acho bem, pode ser que aprendam uma coisa ou duas.
Nos últimos dias saíram ainda outras duas notícias. E nenhuma responde ao critério jornalístico da novidade: São dois casos que servem de presságio (no início de fevereiro escrevi sobre isto) para a legislatura do Chega. Vamos a eles!
Líder da distrital de Portalegre do Chega demite-se por falta de gente na estrutura
“O principal motivo é por não ter quórum, mais elementos. A mesa [comissão política] já não existe, não tenho já vice-presidentes, embora não tenham apresentado a demissão, afastaram-se”, disse.
Ahh! Então nem avisaram ninguém? Que estranho que o discurso de café dê lugar ao comportamento de café… quer dizer, mesmo aí dizemos adeus aos amigos. Se calhar amigos é palavra-chave…
“Caso flagrante.” Transparência Internacional pede explicações por nomeação de pai de deputada como assessor do Chega
Manuel Matias foi nomeado assessor do partido, sendo pai de Rita Matias, deputada do Chega. Trata-se de “uma relação de pai e filha, expressamente prevista e proibida pela letra da lei”, diz a associação, em carta enviada ao presidente da Assembleia da República.
Ventura, you had one job! One job!
Então mas aquilo que é(era) a maior bandeira do partido desmoronou-se no primeiro mês?? A este ritmo, a pertinência desta newsletter vai cair a pique…
Caros e caras democratas, notícias como esta é merecem clipping e colar n̶o̶ ̶b̶a̶l̶n̶e̶á̶r̶i̶o̶ ̶p̶a̶r̶a̶ ̶m̶o̶t̶i̶v̶a̶r̶ ̶o̶s̶ ̶j̶o̶g̶a̶d̶o̶r̶e̶s̶ nas paredes para motivar a luta anti-tachista.
Enfim, com dizem eles e bem:
Outras Leituras
Chega “veio para ficar” ou esteve sempre cá?
Ontem ouvi André Ventura gritar durante 15 minutos no Parlamento e pus-me a ler o novo livro de José Pedro Zúquete, Populismo lá fora e cá dentro. Cada um tem os seus truques para recuperar a calma.
Na primeira página, o investigador diz que estudar o populismo “tornou-se uma indústria” e que, quando a Fundação Francisco Manuel dos Santos o desafiou a escrever sobre o tema, pensou se haveria alguma coisa nova a dizer sobre o populismo em Portugal.
Para fechar
12 Pessoas em Fúria regressa no final do próximo mês.